Muito se fala sobre dependência emocional (ou dependência afetiva), que é quando uma pessoa tem um apego excessivo a relações interpessoais, sejam eles amorosos, familiares ou até mesmo amizades.
Desenvolver uma dependência emocional em uma ou outra relação pode ocorrer com qualquer um, mas você sabia que existem pessoas cuja dependência emocional acaba sendo parte de suas personalidades?
É o caso de quem sofre com transtorno de personalidade dependente (TPD), um transtorno caracterizado por carência afetiva elevada, necessidade excessiva de ser cuidado e validado por outras pessoas, comportamento submisso aos outros, dificuldade para tomar decisões sozinho, apego excessivo e ansiedade de separação.
Como se comporta uma pessoa com TPD?
Pessoas com esse transtorno geralmente não conseguem ficar sozinhas por muito tempo, precisam sempre estar investidas em uma relação íntima — seja amizade, familiar ou romântica —, e permitem que as pessoas às quais são apegadas ditem seus comportamentos, suas maneiras de autoexpressão e até mesmo seus objetivos de vida.
Este padrão de comportamento costuma surgir no início da vida adulta e se apresenta em diversos contextos. A pessoa se torna bastante passiva diante de sua própria vida, permitindo que os outros tomem iniciativas e digam como ela deve viver sua vida, isto é, onde deveria viver, qual faculdade fazer, que tipo de emprego procurar, quais tipos de amigos deve ter etc.
É importante ressaltar que é perfeitamente normal nós ligarmos para a opinião das pessoas que amamos e procurarmos conselhos nas pessoas em quem confiamos vez ou outra. Isso não significa que estamos lidando com uma dependência excessiva dos outros.
Contudo, a pessoa com uma personalidade dependente precisa de afirmação o tempo inteiro, permitindo que os outros opinem sobre tudo e seguindo os conselhos das pessoas cegamente. É uma pessoa que precisa constantemente da validação do outro para conseguir fazer as coisas.
Esse padrão de comportamento se retroalimenta, pois à medida que a pessoa vai dependendo dos outros, esses outros passam a sentir que essa pessoa não consegue se virar sozinha e precisa de seus cuidados.
Por conta do carinho e da consideração existentes na relação, grande parte das pessoas acaba assumindo esse papel de cuidador, satisfazendo as necessidades da pessoa com a personalidade dependente.
A necessidade de reafirmação e aprovação dos outros é tão grande que a pessoa chega a fazer voluntariamente coisas que a fazem mal ou causam desconforto só para conseguir manter as pessoas por perto cuidando de si.
Causa e fatores de risco
Não se sabe exatamente se existe uma causa específica para o transtorno de personalidade dependente. Contudo, alguns fatores de risco para seu desenvolvimento são o histórico de ansiedade de separação na infância e o histórico de doença crônica na infância ou na adolescência.
Acredita-se que a prevalência deste transtorno na população geral é de menos de 1%. Além disso, o transtorno é mais comum em mulheres do que em homens.
Sintomas e sinais
Os principais sintomas do transtorno de personalidade dependente são:
- Dificuldade em confiar na própria capacidade de tomar decisões;
- Sentir que os outros têm um maior conhecimento sobre o que é melhor para si;
- Necessidade de reafirmação e validação dos outros ao tentar tomar decisões;
- Precisar que outras pessoas assumam responsabilidade por áreas significativas em sua vida, como carreira, relacionamentos, autoexpressão, religião, entre outros;
- Dificuldade em expressar discordâncias e descontentamentos por medo de perder o apoio ou a aprovação dos outros;
- Dificuldade em iniciar projetos pessoais ou fazer coisas sozinho por conta de falta de autoconfiança e necessidade de aprovação;
- Ultrapassar limites pessoais para conseguir a validação e reafirmação dos outros, envolvendo-se até mesmo em situações desagradáveis ou prejudiciais para si mesmo a fim de conseguir o apoio do outro;
- Sensação de desamparo quando se encontra só;
- Medo exagerado e irrealista de ser incapaz de se cuidar sozinho;
- Busca estar sempre em relações íntimas, procurando com urgência uma nova relação quando uma relação mais antiga acaba.
Como reconhecer que uma pessoa é emocionalmente dependente de você?
Frequentemente, a pessoa com uma dependência emocional não tem consciência dessa dependência, e cabe aos outros perceber os sinais. Algumas coisas a se prestar atenção são:
- A pessoa pede tua opinião com frequência tanto sobre assuntos sérios quanto coisas mais simples do dia-a-dia, como qual roupa usar ou quais lugares frequentar?
- Quando você dá um conselho, a pessoa o segue de maneira completamente indiscriminada?
- A pessoa fica visivelmente desconfortável em discussões, mas ao ser perguntada sua opinião, sempre diz concordar com você?
- A pessoa nunca nega favores a você, mesmo que ela já esteja cheia de tarefas e outras coisas para fazer?
Se você respondeu sim a todas ou maioria dessas perguntas, certamente está lidando com uma pessoa bastante submissa. Isso não significa necessariamente que é uma pessoa com transtorno de personalidade dependente, mas cabe uma conversa sincera com a pessoa para verificar o porquê deste comportamento, bem como oferecer ajuda para procurar auxílio profissional caso necessário.
Diagnóstico diferencial
O transtorno de personalidade dependente compartilha sintomas com diversos outros transtornos e, por conta disso, pode ser facilmente confundido. Entenda melhor:
Transtorno de personalidade borderline
O transtorno de personalidade dependente tem uma série de sintomas em comum com o transtorno de personalidade borderline (ou limítrofe).
Nos dois transtornos, há uma grande sensibilidade a críticas, medo de ficar só, esquiva de responsabilidades e de tomar iniciativas, bem como a falta de opiniões próprias.
Contudo, há diferenças marcantes no transtorno de personalidade borderline. Enquanto a pessoa com TPB também apresenta sintomas como impulsividade, ataques de raiva, agressividade, pensamento 8 ou 80 e automutilação, a pessoa com TPD não apresenta nenhum desses sintomas.
Além disso, a pessoa com personalidade borderline pode ter dificuldade em alcançar o mesmo grau de submissão que a pessoa com TPD, podendo oscilar entre a submissão e a hostilidade com frequência.
Transtorno de personalidade esquiva
A pessoa que sofre com transtorno de personalidade esquiva também tem uma grande sensibilidade a críticas e necessita de validação. No entanto, ela não se torna submissa para conseguir isso. Do contrário, ela se afasta das relações em que não consegue constante aprovação.
Enquanto a pessoa com personalidade dependente se adapta para caber nas expectativas dos outros, a pessoa com personalidade esquiva se afasta daqueles que tecem críticas, mesmo quando estas são críticas construtivas.
Transtorno de personalidade histriônica
O transtorno de personalidade histriônica é caracterizado pela necessidade de chamar a atenção das pessoas constantemente. Contudo, não há uma preocupação muito grande em suprir expectativas, bem como não importa se a pessoa irá receber críticas ou elogios — o importante, neste transtorno, é chamar a atenção.
A pessoa com esse transtorno não busca a reafirmação e validação dos outros, mas sim provocar sentimentos de admiração ou choque. São pessoas com uma personalidade bastante exuberante, ao contrário das pessoas com personalidade dependente, que tendem a ser tímidas e reservadas.
Caso uma pessoa diagnosticada com transtorno de personalidade dependente apresente alguns dos sintomas citados acima, seria indicado uma nova avaliação para ter certeza que o diagnóstico está adequado.
Tratamento para o TPD
Não existem medicamentos específicos para o tratamento do transtorno de personalidade dependente. Contudo, comorbidades como depressão e ansiedade podem se fazer presentes, e estas são tratadas com medicamentos antidepressivos e ansiolíticos, que por sua vez podem ajudar a aliviar os sintomas do TPD.
Felizmente, com a psicoterapia, é possível tratar vários dos sintomas do transtorno de personalidade dependente. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma terapia que ajuda o indivíduo a identificar percepções distorcidas acerca de si mesmo, dos outros e do mundo.
Com isso, é possível modificar essas percepções para algo mais realista. É a chamada reestruturação cognitiva. Por meio de técnicas específicas dessa terapia, a pessoa começa a perceber que, na realidade, não depende tanto dos outros e é capaz de se cuidar sozinha. Aos poucos, ela vai precisando menos da validação dos outros e passa a ter mais autonomia.
O transtorno de personalidade dependente não traz prejuízos apenas ao indivíduo com o transtorno, mas também a todos ao seu redor que precisam lidar com uma responsabilidade muito maior do que deveriam, fazendo escolhas para a pessoa, cuidando dela e tendo que lidar com a responsabilidade caso algo dê errado.
Por isso, se você desconfia ser emocionalmente dependente ou acredita que alguém próximo sofre com este problema, não esqueça de procurar ajuda de um profissional da saúde mental!
Referências
https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/transtornos-psiqui%C3%A1tricos/transtornos-de-personalidade/transtorno-de-personalidade-dependente-tpd
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-55452004000100009
https://www.verywellmind.com/borderline-and-dependent-personality-425420
https://www.psychologytoday.com/intl/conditions/dependent-personality-disorder
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